Falar
da história é saber
[Existe
docente Chacate?]
Semana passada, estava
sentado, à noite. Uma apresentadora de televisão disse que quem quisesse falar
dever-se-ia apresentar. Boa ideia. Vai daí que um moçambicano, creio, disse que
se chamava Chacate ou Chocate ou coisa assim. Estaria tudo bem se não tivesse
acrescido a isso a sua profissão: docente. A partir daí a coisa muda de figura.
Só ensina quem sabe. De contrário, engana seus alunos.
Na verdade, o problema do
docente é de ter dito que violência se deveu a um Presidente. Deixou de pensar
por si e foi erradamente influenciado por outro que tinha afirmado que se
correu para as eleições, sem que se acautelasse o que poderia acontecer no
futuro em 1994.
Por isso e para que Chacate
e outros conheçam melhor Afonso Dhlakama, gostem ou não que escreva isso em
relação às eleições, transcrevo o seguinte: “Irmãos da Frelimo andam nervosos”.
É comentário de Dhlakama, na edição de 18 de Maio de 1994. O texto diz:
“O presidente da RENAMO,
Afonso DHLAKAMA (o nome Dhlakama vem em maiúsculas na primeira página) disse
ontem em Maputo que os nossos irmãos da Frelimo têm andado muito nervosos de há
um mês para cá.
Segundo Dhlakama, tal
nervosismo deriva dos problemas que se estão a enfrentar no processo de
pacificação do país: ‘Há problemas na formação das nossas forças armada’.
Para a RENAMO, de acordo
com o seu líder, ‘não há tempo para se formarem 30 mil homens antes das
eleições de Outubro’. Na sua opinião, nesta primeira fase devem ser formados
‘apenas 15 mil homens, ficando os restantes em férias durante três meses. O
Governo não partilha dessa opinião.
Afonso Dhlakama deixou
ontem Maputo para Marínguè, onde está a sede do movimento, donde partirá para
Quelimane, a fim de se reunir com dirigentes distritais da RENAMO das
províncias de Nampula e Zambézia, as mais populosas do país.
Dhlakama disse a
jornalistas em Maputo que deverá visitar as províncias de Sofala e Manica –
onde se crê o movimento possua fortes bases de apoio, no próximo mês de Junho”.
Dhlakama acusava a Frelimo de ter
no seu seio pessoas que, por terem vivido bem durante a guerra não viam com
bons olhos o fim do conflito, em entrevista publicada pelo Diário de Moçambique, na edição de 3 de Janeiro de 1994.
“ (…) Reparem que o Presidente Chissano já há
meses que me promete um gabinete de trabalho em Maputo, mas até hoje quando me
desloco à capital do país, sou forçado a trabalhar na residência que me está
destinada. Isso é só um exemplo”, palavras atribuídas a Dhlakama.
O semanário Domingo questionou no dia 2 de Janeiro, através de uma entrevista a
Teodato Hunguana, então ministro do Trabalho e um dos membros da Comissão de
Supervisão e Controlo (CSC) do Acordo Geral de Paz (AGP), a irreversibilidade
da paz alcançada em Outubro de 94.
Hunguana declara, sobre se a paz
era irreversível ou não, que “há pontos de interrogação tão preocupantes,
angustiantes, tão inquietantes, mas, de facto, temos razões para estarmos
preocupados porque o processo ainda não provou a sua irreversibilidade”.
Ele considera mesmo, nessa
entrevista, não ser impossível o retorno “a uma situação extremamente
complicada neste país. Pelo menos mantêm-se todos os factores que permitem esse
retorno”.
Quais seriam, na perspectiva de
eleições marcadas para Outubro de 1994, as preocupações que poderiam reconduzir
o país a uma situação extremamente complicada? Ele aponta, na entrevista, os
seguintes aspectos:
·
Atraso
de mais de um ano no processo de acantonamento de guerrilheiros e tropas
governamentais, daí considerar que estava a ocorrer um acantonamento simbólico.
·
O
acantonamento dos 80 mil homens previstos, iniciado em finais de Novembro de
1993, até 24 de Dezembro do mesmo ano tinha abrangido 24 mil efectivos.
·
Presença
em Moçambique do grupo malawiano Young Peeners, que serviu de base de
sustentação da Renamo.
Tais inquietações levam-no a
concluir que sem que fosse alcançado o momento-chave, o acantonamento dos 80
mil homens, o país corria o risco de realizar eleições num clima de
intimidação, violência directa ou psicológica, podendo o todo o processo ser
condicionado.
Hunguana considera o optimismo
como vontade de realizar as eleições [de qualquer maneira], quando até
subsistiam questões tais como de desmantelamento das forças irregulares.
Parece que havia uma vontade, do
lado da Renamo, se calhar indomável, de realizar as eleições em Outubro de
1994.
Afonso Dhlakama acusava Frelimo
de pretender adiar as eleições de Outubro de 1994, para limpar a sua imagem de
marxista.
Já deixei expresso nesta espaço
que não escrevo o que não esteja documentado sobre esse assunto que considero
gravíssimo. Com muita pena vejo concidadãos meus que aparecem nas televisões
usando títulos académicos para credibilizar as suas intervenções, contrariando
as regras académicas.
Se nós quisermos discutir a
questão de paz, não podemos apenas pensar que é puramente uma questão de ter
espaço na televisão. Se queremos a paz, não vale a pena mentir.
O mais grave é que nas nossas
televisões estão nossos filhos/netos que nunca procuraram ver o que aconteceu
antes e depois são enganados pelos seus professores como o tal de Chacate ou
Chocate e outros.
Quem quiser falar, antes deve se
preparar. De contrário, vai fazer mal ao seu país. Eu não tenho vergonha de
escrever que há quem esteja a fazer mal ao país, mas infelizmente tem apoio de
pessoas que nunca se preocuparam em ver o antes.
A história não é uma
invenção. Documenta-se. Outra coisa seria tagarelice. Afonso Dhlakama sempre
pressionou e nunca, ao longo do tempo, deixou de se servir da ameaça de guerra.
Não estou a falar da minha opinião, mas sim do que está documentado. A paz
precária, senhor Chacate ou Chocate, não tem nada a ver com um tal Presidente,
porque, se assim fosse, Dhlakama não estaria a fazer violência em 2016.
Estou com muita pena dos
seus estudantes, que têm à frente um opinante e não um professor que usa a
ciência, porque uma coisa é opinião e outra é conhecimento científico, mas
quando se fala de ciências sociais e políticas. Ser docente é diferente de ser
alguém que expressa a sua opinião. Só se ensina a verdade. A mentira é coisa da
rua, de “tchungamoyo”, de “dumba negue”.
Meu irmão, vamos lá falar
a verdade! Afinal em 2012-2014 o que Dhlakama dizia, para haver violência? Hoje
fala de governar seis províncias. Esse tal de Presidente tinha-se desentendido
com ele por causa de governar seis províncias? Não é verdade, porque a questão
das seis províncias decorre das eleições de 2014.
Antes disso, a mesma
questão tinha sido posta depois das eleições de 1999 quando, na verdade, diferentemente
de 2014, a coligação Renamo-União Eleitoral tinha conquistado a maioria no
Niassa, Nampula, Zambézia, Tete, Sofala e Manica. Os candidatos presidenciais
nesse ano foram Joaquim Chissano e Afonso Dhlakama. As reivindicações da
Renamo-União Eleitoral terminaram em banho de sangue. Apoiantes da Renamo até
deceparam os pénis de um jovem Polícia em Montepuez. O que isso de veio aquele
Presidente, no caso o fulano, quando já antes em 2000, por exemplo, tinha-se
vivido um cenário de extrema violência – nem todas as vítimas morreram, há
sobrevivente!
Por fim, gostei de ouvir
a sobrinha de Afonso Dhlakama, Ivone Soares, a ser citada como tendo dito que
era urgente a revisão da Constituição da República. Não é que defenda a revisão
da Constituição, mas reputo de uma discussão correcta usar a lei. A arma de
guerra é algo brutal e mata, não faz sentido.
Quero sublinhar: a pessoa de Chacate, como pessoa, não
me preocupa tanto, mas o facto de ser docente e dizer o que declarou, choca-me.
Se em 2000 pouco percebia, uma releitura dos acontecimentos refrescar-lhe-ia a
memória
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