sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Milando do Calado Calachinicov versus caso Nuno Castel Branco

(Convite a debate sobre liberdade)
Diz-se, melhor, publica um semanário, um dos mais antigos em Moçambique, a seguir ao Domingo, que  Gilles Cistac apresenta queixa à Procuradoria Geral da República (PGR), estando em causa escritos difamatórios publicados nas redes sociais.
Se, de facto, o faceboqueiro Calado Calachinicov escreveu isso, de que Cistac obteve a nacionalidade moçambicana de forma fraudulenta, meteu-se num grande milando, deixando de lado a sua apreciação, opinativa, de que o constitucionalista estaria “a fomentar a divisão do país para obter ganhos obscuros”.
Cito excertos do artigo desse semanário:
“(…) os escritos deste faceboqueiro constituem um verdadeiro atentado à sua honra e ao seu bom nome pelo que, optou por avançar pela via judicial para exigir a reposição de danos…
(…) as acusações de Calachinicov constituem o ponto mais alto da intolerância bem como da violação dos direitos fundamentais”.
Cistac é citado a declarar que já sentiu sinais de intolerância política, académica e até de racismo. Ele tudo isso ignorou, mas acha que já basta, quando aparecem acusações de prática de actos criminosos e por isso diz: “Vou avançar com uma queixa crime junto à Procuradoria”.
Esta queixa de Gilles Cistac recorda-me o que se diz no caso do escrito do Nuno Castel-Branco. Não faltaram artigos condenando o facto de a mesma PRG ter intimado Castel Branco, defendendo-se que isso era contrário à liberdade de expressão e de imprensa. Que tudo o que Branco tinha escrito fê-lo em pleno gozo desses direitos previstos na Constituição da República.
Não será que num caso, quando convém a determinados sectores, incluindo a imprensa, se discutem as tais liberdades, mas noutro, não.
Lembro de um agora deputado que chegou a falar de fascismo em Moçambique, ao atacar o mais alto magistrado da Nação Moçambicana. Se tivesse sido intentada uma queixa contra essa figura, o que teríamos ouvido é que há perseguição, intolerância, coarctação da liberdade de expressão.
É amnésia? O que nós, moçambicanos, prosseguimos? Não seria a hora de revermos a nossa atitude para que não confundamos a opinião pública? Estaria Gilles Cistac a intimidar o Calado Calachinicov ou não? A queixa seria manifestação de tolerância ou não,  analisando o caso e relacionando-o com o de Nuno Castel-Branco, que também passou pelas mesmas redes sociais?

II
E, mesmo para misturar, do mesmo semanário leio que Munícipes da Beira “gazetam” comício da Frelimo. Quem são os tais munícipes?
Até porque essa é a parte menos pitoresca do artigo, pois a mais engraçada é a diz que “(…) o partido Frelimo delegou aos chefes de quarteirão, membros dos grupos dinamizadores e membros da Organização da Juventude Moçambicana (OJM) a missão de se deslocarem aos bairros e apelar às comunidades para se fazerem presentes”.
OJM? Ainda pode ser verdade, mas os chefes de quarteirão e os grupos dinamizadores, se não for ficção jornalística, não se podem ter envolvido nessa mobilização, porque a sua existência está claramente ligada ao Conselho Municipal da Beira e, por essa via, o mais provável é que estejam filiados no MDM e não na Frelimo. Até os régulos estão ligados ao CMB e por essa via mais próximos do MDM, liderado por Daviz Simango!
Não quero acreditar que o CMB ou MDM tenha trabalhado a favor do adversário político, a Frelimo. Deve ser peta e se fosse a reler Nós Matamos o Cão Tinhoso, reproduziria que “é peta do Quim”.
O narrador nesse conto de Luís Bernardo Honwana diz:
“(…) O Quim disse-me também que as feridas do Cão-Tinhoso eram por causa da guerra e da bomba atómica, mas isso é capaz de ser pêta.  O Quim diz muitas coisas que a gente nem pensa que podem não ser verdadeiras, porque quando ele as conta a gente fica tudo de boca aberta. A malta gosta de ouvir o Quim a contar coisas de outras terras e os filmes que vai ver lá em Lourenço Marques, no Scala, e as coisas do El Índio Apache a jogar luta-livre e a fazer tourada, e aquilo que El Índio Apache fez ao Zé Luís no Continental. O Quim diz que El Índio Apache só não vai ao focinho ao Zé Luís porque não quer”.
Ou seja: a mentira se confunde com a verdade. E quer nas redes sociais quer em outras ferramentas de comunicação anda muito Quim escondido, a contar coisas ou escrevendo o que “gente nem pensa que podem não ser verdadeiras, porque quando ele as conta a gente fica tudo de boca aberta”.
Não é de ficar de boca aberta quando se diz que a Beira tem chefes de quarteirão e de grupos dinamizados afectos à Frelimo, que não conseguiram fazer a Frelimo triunfar? Que coisas!


quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

ARITMÉTICA DE MANO MANÉ

[Mais achas para a fogueira]

Aritmética de Mano Mané, pode agitar as consciências lá na cúpula do Democrático, o Movimento de… Para Todos, mas que se diz ser para poucos. Isso de ser para poucos, pode ser má língua. Má língua, há para tudo e todos, em todos os momentos.
Todas as semanas capas de jornais, ora dizem que esta dança é exclusiva para execução daquele e outro não dança da mesma maneira, ora o político fulano não se entende com político sicrano, enfim, vão sendo criados, arquitectados é mais bonito, soa bem, problemas, para criar desconfiança, onde a confiança se via florescente.
Obras de má língua, até podem passar para vídeos e depois se discute se é ela ou não… Mas isso é outra coisa, não parece o caso do Para Todos e Mané, o De Araújo.
Pela insistência do Mané, que não se confunde com o finado do Ansumane, de Bissau, de resto nunca houve nada semelhante, senão a magreza, se for, porque não vejo de perto o Mano, passam anos, tirando as imagens nos jornais e televisões, não há fumo sem fogo.
O Mano Mané, De Araújo, tem estado a questionar a democraticidade lá no Movimento e até discordou do que o Democrático usou para justificar o desaire nas presidenciais, legislativas e na eleição para as assembleias provinciais, tendo em conta as expectativas não só internas mas também externas enquanto prevalecia Sadjunjira e as sondagens diziam o que eram as suas conclusões, porque, de contrário, até amealhou um pouco lá na 24  de  Julho.
Logo ele disse que havia que assumir os erros cometidos, quando os outros, seus correligionários, incendiavam a casa do adversário ladrão eterno – só eles nunca roubaram nada, nem uma manga do quintal alheio quando eram crianças!
Queria o Mano Mané, voltando à vaca fria, que o chefe da bancada do Democrático fosse um deputado eleito pelo círculo da Zambézia. Não conseguiu porque Chiveve é água que corre e Coco cai e para se ver água é preciso parti-lo.
O que pode ser estranho é que no mandato passado, salvo esquecimento meu, esta minha cabeça cheia de preocupações até me pode provocar amnésia, não se ouviu nenhuma voz, lá  na 24 de Julho – talvez porque o  neto rejeitado do Dzovo não tinha assento –, pedindo a existência do terceiro vice-presidente parlamentar, na ideia de que o contrário seria exclusão.
Nada. Formou-se a terceira bancada de oitos deputados sem nenhuma outra reivindicação, diz-se com beneplácito da maioritária, contra a vontade da eternamente segunda organização política mais votada, sempre que desiste dos boicotes que só afectam as autárquicas, pouca coisa se pensarmos na AR.
Será o efeito Mano Mané, que inspira as vozes do Democrático à procurar acomodação para serenar os ânimos? Não sei. De resto o nome do candidato a terceiro vice-presidente não chegou a ser revelado, se seria da Zambézia ou Nampula ou, para uma machadada, de Sofala! É que aí já não parece uma questão aritmética. Mas dá para reflectir, se o Democrático não procura acalmar as ondas turbulentas, mas imperceptíveis (?), com Mano Mané a deitar mais achas para a fogueira, através da 24  de Julho.
Há que lembrar a discórdia que se instalou em Nampula na constituição de listas de candidatos antes das eleições do ano passado. O Democrático pode precisar de deitar muita água na fervura e um terceiro vice-presidente da AR, sairia como uma arma secreta.
Que o Mano Mané está a dar muito TPC ao Democrático, lá isso é verdade! Mas não se pode dizer que seja o calcanhar de Aquiles da liderança do Para Todos, seria exagero. Afinal todos os partidos têm as suas intestinais! Maldita Constituição e Regimento!... Mas tudo se ajeita.



terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

DE AFONSO DHLAKAMA A GILLES CISTAC

De Afonso Dhlakama a Gilles Cistac
I
Afonso Dhlakama, segunda-feira, insistiu na vontade de governar, querendo que se criem províncias autónomas no centro e norte do país, no segundo encontro com o Presidente da República, Filipe Nyusi. A proposta irá para a Assembleia da República, à partida, com ameaças.
Como atribuíram ao académico Gilles Cistac a possibilidade de cobertura constitucional desse projecto aparentemente complexo, vale a pena que o assunto seja debatido, ainda que não se saiba com que linhas se há-de coser a autonomia, havendo a evocação do tal número 4 do artigo 273 da Constituição da República, chamado por Cistac.
Há vários registos sobre a divisão do país pretendida por Afonso Dhlakama desde 1994-95, a partir do Save, reivindicação de receitas de Sofala, Manica, Tete, Zambézia e Nampula,  incluindo parte dos ganhos da empresa Caminhos de Ferro de Moçambique, região centro, nomeação de governadores indicados pela Renamo, desejo de emenda constitucional para ele ser vice-Presidente da República, governo de unidade nacional e actualmente governo de gestão ou a variante províncias autónomas.
Estes e outros discursos do presidente da Renamo [até houve o de paralisação do país em menos de 24 horas] estão nos jornais arquivados, podendo ser lidos por quem quiser. Por isso, Leite de Vasconcelos, escreveu numa das suas crónicas, que faz parte da colectânea Pela boca morre o peixe: “A ressaca pós-eleitoral da Renamo está a conduzir Dhlakama, não ao seu “segundo eu”, mas de regresso ao primeiro. Transparece, cada dia mais evidente, a sua incapacidade de se afirmar no terreno da luta política”
Por exemplo, citado pelo semanário Domingo de 28 de Agosto de 1994, antes das primeiras eleições, o presidente da Renamo dizia: “O meu problema não é ser vice-presidente, mas sim o que vai acontecer 24 horas depois das eleições. A minha posição não é de fraqueza, mas sim de força.
(…) vai haver compromisso sobre futuro político de Moçambique até 25 de Setembro. Diz-se que na Constituição não está previsto o cargo de vice-presidente, mas se for necessário, a Assembleia da República pode reunir-se rapidamente e colocar esse postulado.
Eu ainda não apresentei esta minha proposta ao meu irmão Presidente Chissano, mas este é o meu sonho, e já falei disso com diplomatas, e muita gente diz: mas como é que o Presidente está a sonhar, e eu digo este é o sonho que eu tenho, não porque o país está totalmente destruído, mas porque em África é muito difícil que haja vencedores e vencidos para trabalharem em conjunto nos primeiros anos das eleições.
Eu tenho dito que temos que aproveitar as experiências que os outros têm porque qualquer democracia tem a sua história, porque nós não acreditamos que a Frelimo, a Renamo, o Pademo ou Unamo, ganhando as eleições, cada um destes partidos pode governar sozinho, e nessas condições, mesmo se formos ler a história dos Estados Unidos, Portugal, ainda caíram 16 governos a seguir à Revolução de 25 de Abril de 1974, e depois os portugueses aprenderam, e por isso mesmo, nós não podemos copiar o que os americanos estão a fazer hoje, o que os italianos estão a fazer hoje”.
O semanário Domingo cita um diplomata africano, na condição de anonimato, a considerar que a proposta de Afonso Dhlakama não era de sua iniciativa, considerando ser estranho que se exija democracia para África, mas que:
“quando chega a hora da verdade se diz que África não está preparada para  a democracia, então começa-se a inventar fórmulas e mais fórmulas que corrijam a vontade popular, o sufrágio. Se se fazerem as eleições é para um efeito útil; não é fazer eleições para nenhum efeito útil, como se não tivesse havido eleições; dizer que os vencedores e vencidos são a mesma coisa; então estamos a perder milhões e milhões de dólares que deveríamos gastar na reconstrução do nosso  país”.
II
Num dos artigos em que se atribui a Gilles Cistac a possibilidade de transformar as províncias onde a Renamo venceu em autarquias, diz-se que seriam Sofala, Manica, Tete, Nampula, Zambézia e Niassa. Ora, Afonso Dhlakama não ganhou as eleições na província do Niassa, porque o edital do Conselho Constitucional refere que ele obteve 112.558 votos e Filipe Nyusi, 123. 092. Salvo se o edital estiver errado.
Dhlakama esteve em Cabo Delgado e reivindicou vitória, mas os resultados validados pelo CC dizem que reuniu 77. 388  votos e Nyusi, 327. 354 votos. Não são estes dados que o presidente da Renamo usa. No fim das reportagens que lemos ou ouvimos, estranhamente, não se recorda aos leitores, ouvintes e telespectadores quais são os resultados válidos, deixando o cidadão incauto a julgar que é verdade o que Afonso Dhlakama afirma nos seus comícios populares, incluindo em Cabo Delgado. Há que ter cuidado, porque uma mentira repetida pode parecer verdade, sobretudo num país onde mesmo os que sabem ler nem todos lêem.
E aí começa uma das complexidades da indicação das províncias autónomas, porque se dá a ideia de que seriam as regiões onde Afonso Dhlakama foi mais votado ou ganhou, se quisermos. Porém, nos seus discursos, ele não usa a informação oficial, ficando-se por saber quais seriam as futuras províncias autónomas, se o que consta dos editais do CC ou o que diz nos seus discursos.
Outro problema que se põe, pensando nos locais onde determinado candidato é mais votado ou ganha, é que não se tem em conta que numa mesma província há distritos, postos administrativos e localidades onde eventualmente Afonso Dhlakama não tenha sido o mais votado que Filipe Nyusi. Dando exemplo: pode acontecer que Dhlakama tenha mais votos que Nyusi na província de Sofala, mas no Dondo Nyusi ter conseguido mais votos que ele. Como fica? Ele governaria Sofala sem incluir Dondo? Aparentemente é a ideia que sugere o facto de Dhlakama governar onde ganhou e Nyusi também dirigir as províncias onde venceu.
Se Dhlakama obteve 171. 817  votos na província de Manica contra 168. 860 de Filipe Nyusi, quem garante que não haja distritos, postos administrativos ou localidades onde o seu adversário, da Frelimo, tenha saído vencedor? E isso pode ter acontecido em várias províncias, daí o projecto de autonomia se afigurar, à partida, um assunto que pode não ser o que aparenta, pois Moçambique teria que ser retalhado sem fim.
III
Curioso, lendo o que se atribui ao académico Gilles Cistac, é o facto de se pretender esquecer que a votação não era referente às províncias autónomas, mas sim para a escolha de membros das assembleias provinciais, deputados da Assembleia da República e Presidente da República. Logo, acredito que haveria outra eleição, para que Afonso Dhlakama fosse governante das províncias onde ganhou, para permitir que outros candidatos também pudessem aspirar a esses cargos. Mas podia acontecer que nas mesmas províncias não ganhasse. Pode não ser líquido que nas próximas eleições autárquicas a Renamo ganhe na cidade da Beira. A vontade muda.
Se houvesse províncias autónomas, as eleições teriam que ser realizadas para a escolha de governantes dessas províncias e não um candidato vencido nas presidenciais, depois ter de procurar a província onde ganhou para se autoproclamar governante.

Atribui-se  a  Gilles Cistac esta afirmação: “A gente fala da Renamo mas quem votou nela foram os moçambicanos (…)”. Ora nenhum moçambicano foi às eleições em províncias autónomas, não houve eleições para escolha de presidente de províncias ou regiões autónomas. O que os moçambicanos fizeram foi a escolha do Presidente da República, deputados da Assembleia da República e membros das assembleias provinciais. E como fiz questão de referir, é possível que numa mesma província, as preferências dos candidatos tenham sido diferentes nos distritos duma mesma província, idem postos administrativos e localidades. São moçambicanos na mesma. Há moçambicanos da mesma província que votam em candidatos e partidos diferentes, se calhar irmãos que são militantes de organizações políticas diferentes. (X)