segunda-feira, 20 de julho de 2015

HISTÓRIA FAST FOOD DA RENAMO


I
Duvido se é de alguma utilidade, hoje, a Renamo se justificar ou escrever uma nova história sobre as suas origens, causas de surgimento e objectivos prosseguidos: se o que está escrito pode ser reescrito, isso não significaria eliminação da verdade histórica.
[A verdade histórica é um limite que não se deve violar (…) ”. É assim como pensa o romancista  cubano, Leandro Padura. Esta declaração fê-la em entrevista à Folha de São Paulo, numa das edições deste jornal brasileiro].
Mas, em contrapartida, reputaria de grande préstimo, por concorrer para a estabilidade do país e tranquilidade dos moçambicanos amantes da paz, procurar fortalecer-se como uma organização política desarmada.
As armas amordaçam as ideias, as provavelmente boas em ambiente democrático e da razão, esta como apanágio do homem, incluindo o discurso recorrente do seu líder sobre como surgiu a organização MNR, prevalecendo a  Renamo que a Afonso Dhlakama dela tenta se distanciar (?) ao procurar oferecer a história fast food.
 [“A guerra civil foi justificada pela causa de traição da independência por parte da Frelimo” – diz hoje Dhlakama].
Mantendo-se armada e com vontade de permanecer armada, a organização “político militar” liderada por Afonso Dhlakama, a cada dia vai revelando aos moçambicanos as suas bases em Tete, Inhambane e Gaza. Era de supor terem sido desmanteladas, com a assinatura do Acordo Geral de Paz, a 4 de Outubro de 1992.
Creio que, por este andar, Dhlakama revelará novos nomes das suas bases e dos ataques que tem ordenado – assumiu o de Tete este ano.
Desde 1992, o que se apregoou, com coro de personalidades cujo discurso se assumia como inquestionável na interpretação do AGP, foi: o presidente da Renamo tem [uns 150] homens da sua segurança pessoal como líder e isso está previsto no acordo de Roma.
Li várias vezes o Acordo Geral de Paz. Não achei nenhuma linha, frase, período ou parágrafo estabelecendo: Afonso Dhlakama deverá manter ou instalar bases em Sadjunjura, Nampevo, Muxúnguè, Guijá ou outro ponto qualquer de Moçambique quer para a sua segurança pessoal quer para outros fins, tais como os ataques ocorridos de 2013 a 2014.
Como me tenho dedicado à leitura e análise de vários acontecimentos, entre os quais os que envolvem a Renamo e o seu líder, para entender a não cessação definitiva da violência e não desarmamento, gorando-se desde 1992 as expectativas, não escondo [parafraseio Dhlakama nisso de “não escondo”]: a possível existência de homens desde então escondidos pela Renamo, não me espanta.
O homem do “dito verdadeiramente dito” desinteressadamente até conseguiu do Zimbabwe
 [Rodésia de Ian Smith, certeza absoluta] três armas, AKM, emprestadas. Curioso!
Mas, em história, quando se aborda a fundação de uma organização política como seria o caso da Renamo, torna-se insuficiente declarar em entrevistas ou comícios que fulano, sicrano e beltrano se reuniram, secretamente, para fundar um movimento armado ou político.
Não sei se existe uma organização do género cuja história se resuma a encontros não documentados. As conversas entre Afonso Dhlakama, André Matsangaíce ou provavelmente outros, a terem ocorrido, seriam a fase preparatória para a criação da organização MNR.
A fundação de um clube de futebol, empresa, igreja, etecetra, tem uma etapa formal. A sua existência, em situação normal, tem como testemunho uma acta ou outras referências relevantes e irrefutáveis: um lugar concreto, presidente da assembleia, órgãos eleitos constitutivamente, sufragados ou nomeados – e em caso de nomeação, o nome de quem nomeia – participantes e convidados ao evento.  
Penso ser isso o que a nova Renamo, existindo para negar a velha ou contestar o que considera ser mentira da Frelimo [a ser mentir, de facto, haveria muitos historiadores ou intelectuais mentirosos e, mais do que isso, tão maus que são devem detestar a Renamo, e, por isso, em tudo o que se pode ler, escrito por eles, associam a existência da MNR ao serviço de inteligência rodesiana], querendo, pode desvendar.
De contrário, perde tempo com fast food, que daí pode não passar. Parece não ser relevante, hoje, discutir como a MNR, mais tarde Renamo, nasceu, sua visão e missão em Moçambique. Seria de grande interesse, acredito eu, provar que não existe para guerras contínuas, desarmando-se e não se mantendo como pode ter ocorrido há 37 anos.
O partido de Afonso Dhlakama tem história diferente, contrária da convergente na sua ligação com a Rodésia de Ian Smtih? O que se sabe sobre MNR/Renamo não foi escrito tudo por pessoas ligadas à Frelimo. Vale a pena, aí, insistir no que diz Leonardo Padura: “A verdade histórica é um limite que não se pode violar”.


II
Domingo passado, a Renamo novamente pode ter escrito mais uma história fast food: celebração dos 35 anos do seu destacamento feminino. Foi a 5 de Junho de 1980, diz-se, que ocorreu a incorporação das primeiras mulheres, juntando-se aos homens da organização MNR, na luta “pela democracia”.
O que é problemático? Parece [escrevo parece porque pode ter escapado uma notícia sobre isso] que a Renamo, numa situação normal, estaria a exaltar esse feito há bastante tempo. Por exemplo, em 1995, um ano após as eleições, poderia ter celebrado15 anos dessa incorporação.
Mas em 1995, Afonso Dhlakama entretinha-se a ameaçar dividir Moçambique.
Ele exigia que Joaquim Chissano nomeasse governadores indicados pela Renamo para Sofala, Manica, Tete e Zambézia, assim como parte das receitas dos Caminhos de Ferro de Moçambique. Manuel Pereira falava de colocar cancelas no Save.
Sem surpresa, leio na edição de A Bola, do passado domingo [dia 5 de Julho de 2015, para que não haja equívocos]: “Líder da Renamo ameaça cortar principal estrada do país”. Que azar persegue os moçambicanos?
Por quê? Simples: em nenhuma das notícias inseridas no topo das colunas do diário desportivo português referentes aos cinco Países de Língua Oficial Portuguesa, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, tirando Moçambique, se estimula violência.
A notícia do topo para a coluna de Moçambique é mais uma a “ameaça” de Afonso Dhlakama!  
Sem que fosse celebrado com periodicidade tal marco, que se quer histórico para a Renamo, 35 anos depois, faz-se uma cerimónia, mas até ao momento em que escrevo estas linhas ninguém revela os nomes das combatentes homenageadas. Estão vivas? Porque desde 1992 não apareceram em público, contrariamente ao que fazem as de outras organizações em Moçambique?
Sei que é possível, por exemplo, provar quem esteve no II Congresso da Frente de Libertação de Moçambique, de 20 a 25 de Julho de 1968, em Matchedje, mesmo daqueles que um político desatento [não seria boateiro?] declarou, em entrevista à televisão, que seus nomes não tinham sido gravados em mármore no monumento já erguido.
Até os moçambicanos mais novos conhecem mulheres do Destacamento Feminino da Frelimo, não interessando se todas ou não. 
A Renamo não tem documentos sobre a sua história, além de entrevistas concedidas pelo seu líder? Por quê? Foram destruídos durante a guerra dos 16 anos? Espero que as mulheres que se filiaram no MNR no dia 5 de Junho de 1980 contem a sua história irrefutável aos moçambicanos. Desde lá, passam cerca de 35 anos.
Seja como for, é preferível Afonso Dhlakama no fast food 5 de Julho de 1980, a ouvi-lo a confirmar ordens dadas aos seus homens para atacarem agentes do Estado em Tete.
Mas na cerimónia de algures em Dombe, tendo em conta a notícia do jornal A Bola, repetiu os caldos entornados. Dhlakama fez como no passado: em vez de celebração dos feitos, ameaça.
A última grande celebração do aniversário da morte de André Matsangaíce, em Outubro de 1912, acabou com um ensaio militar ou reagrupamento dos homens armados, que em 2013 semearam dor e luto, sobretudo no troço Muxúnguè-Save.
Uma coisa semelhante entre Sadjunjira e Dombe: um local é preparado para reunir homens e mulheres, mas praticamente ninguém disso se apercebe. Dhlakama usou ambos os eventos para fazer ameaças aos moçambicanos.
“Vou esticar a corda e acabar com a paciência”, declarou o líder da Renamo, segundo o jornal A Bola.
O que fará pelas combatentes que há 35 anos foram recrutadas para as fileiras da sua organização?
Não se sabe, senão, de acordo com a mesma fonte, que “o número um da Renamo ameaçou não só cortar a N1 como evacuar edifícios públicos e expulsar administradores locais nomeados pelo governo”.
A Renamo e Afonso Dhlakama têm uma forma sui generis de valorização dos seus combatentes: renovação de actos de instabilidade! São os homens armados amordaçando o que seria uma organização política em ambiente em que a razão é o apanágio do homem. (X)

PS: Escrito o artigo, fui achar uma entrevista interessante de Dhlakama, a revelar que quando estiver no cargo de Presidente da República de Moçambique vai escrever a história da Renamo. Espero que alguma longevidade da família me dê esse prazer.
Anseio  também que não cair em nenhuma daquelas emboscadas “tipo” Muxúnguè, Save e por aí fora do passado, porque aí  as coisas tornar-se-iam mais complicadas. É quando se tem de falar de sorte!




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