quarta-feira, 28 de julho de 2021

AS CARTAS DE EDUARDO MONDLANE

09/02/2012

As cartas de Eduardo Mondlane

Por  FRANCISCO MUIANGA

Moçambique está a viver um momento interessante da sua história. Se, por um lado, vão sendo publicadas obras, através das quais os veteranos da Frente de Libertação de Moçambique dão testemunho, no seu modo de interpretação da luta armada e factos a respeito desse evento, por outro, o debate aquece, nem que seja para questionar se o cinquentenário é da FRELIMO ou da Frelimo? Janeth Mondlane, viúva de Eduardo Chivambo Mondlane, veio, numa entrevista à TV,  com um facto interessante: ela vai publicar as cartas escritas por Mondlane. E aí, penso, há-de ser uma pena que esses escritos do Dzovo, se me permitem, nem todos em português e daí ser uma obra sua tradução, não cheguem às mãos dos interessados em lê-los antes de 25 de Junho de 2012.
Uma pena, por quê? À partida, considero que vão despertar interesses não só dos estudiosos, académicos, mas eventualmente de muita gente, incluindo curiosos.
Sem querer, talvez, Janeth aguçou a curiosidade, que creio ser de muitos, ao advertir que omitirá aspectos delicados do que Mondlane escreveu (delicado é minha interpretação), a respeito de pessoas ainda vivas.


Mais avidez, de leitura, não provocaria a declaração da viúva de Mondlane, se não dissesse que caberá, mais tarde, aos filhos divulgarem as omissões, se for do interesse deles. Logo: as cartas abordam questões profundas da Frente de Libertação de Moçambique, em que são protagonistas Eduardo Mondlane e seus camaradas.
A viúva de Mondlane não quer, compreendo assim, produzir polémicas, se bem que estas, quando bem conduzidas, possam ser úteis: limam as arestas, ajudando os leitores a ajuizarem melhor determinados factos.
Ela prefere omitir o que escreveu quem já não existe na face da terra, a provocar reacções inimagináveis dos vivos, cujos nomes constem das cartas — os mortos não se podem defender nem contestar prováveis interpretações duvidosas dos seus actos e seria complicado um debate entre estes e os vivos.
A FRELIMO viveu momentos conturbados, um dos quais em 1968. Não será que Mondlane escreveu sobre esse momento? Pode ser que sim. E a tê-lo feito, a divulgação das cartas permitirá que se saiba o que ia na sua alma, se os factos estão ajustados ao que se sabe ou não, como reagiu.
Mas pode ser que nas próximas edições disso não saibamos, se as pessoas ainda vivas, situação acautelada por Janeth Mondlane, forem referidas. Seja como for, abre-se a possibilidade de se compreender Dzovo pelo seu punho, as suas preocupações, as dificuldades de liderar uma Frente, óbvias, se atendermos aos conflitos, seu assassinato e mais acontecimentos que até aqui não apresentam a sua versão.
É uma parte importante do cinquentenário da FRELIMO/Frelimo e arrisco-me a considerá-la indispensável. Provavelmente a divulgação desses escritos venha  estimular outras iniciativas do género porque, certamente, se a viúva de Mondlane guardou cartas, outras figuras envolvidas na luta armada devem ter outros testemunhos escritos ou não de diferentes intervenientes.
Os livros, dos poucos publicados, quer pelos veteranos da guerra colonial do lado da Frente quer por outros moçambicanos, vão revelando factos que tornarão mais sólida a história contemporânea de Moçambique.
Quero contar um episódio: um dia, ouvi, mas não estava sozinho, fazer-se uma referência a uma das tantas figuras cujo percurso nas acções inscritas na procura de emancipação dos moçambicanos tem sido descrita. Era uma versão diferente e quem falou, introduziu um elemento extremamente forte, que era a proximidade, vizinhança, com essa figura, embora com ressalva de diferença de idade.
Não me causou espanto, porque, procuro pensar de forma crítica, fazer as minhas interrogações, análises e tentativas de conclusões. Até então, tinha lido poucas referências a essa figura, mas como se o divino me tivesse ouvido, pouco tempo depois li sobre a tal figura três livros, de autores diferentes.
Longe de mim está a intenção de julgar quem quer que seja.”O julgamento: Quando julgamos muito severamente, estamos a bloquear a nossa visão, deixando de enxergar as pessoas em toda sua complexidade. Ninguém pode ser rotulado. Existem tantos lados, quanto existem opiniões. É por isso que a mesma pessoa pode ser simpática para uns e irritante para outros. Perceba então que na verdade você só vê uma projecção de si mesmo no outro” — Arcano do Dia, dia em que iniciei a escrever estas linhas.
Mas, essa referência e os outros livros que li, o último dos quais com muitos detalhes, como se a obra fosse dedicada exclusivamente a essa figura — na verdade o escrito tem detalhes importantes sobre os eventos referentes à luta de libertação e outros registados até 1974 —, permitiram-me construir um certo conhecimento sobre a tal figura.
É por tudo isso que, com enorme expectativa, acredito que o  livro inspirado nas cartas de Eduardo Chivambo Mondlane será interessante. Com omissões ou não, está em perspectiva uma nova fonte da nossa história, que há-de ser de grande valor para a compreensão de determinados factos.

DIÁRIO DE MOÇAMBIQUE – 08.02.2012

 

quinta-feira, 11 de junho de 2020

O ERRO ESTÁ NO DDR OU NA MANUTENÇÃO DA RENAMO ARMADA?

Caro cientista político, qual é o futuro dos militares que não estiveram do lado da Renamo - as chamadas tropas do Governo - que foram mandados para casa em 1994?
Parece que há um esforço muito grande para carregar a Renamo, em vez de ser desmilitarizada.
Alguém tem ideia de quanto homens estiveram nas FAM que estão na miséria - o número supera de longe os 5. 221 e basta recordar que o exército teria 30 mil homens, metade dos quais das FAM e outra da Renamo.
A partidarização do Estado ou não, não nos deve levar a manter o que é o principal erro: Renamo armada! É gravíssimo termos um partido armado!
De resto, o que esperam os cientistas/académicos para convencer Mariano Nhongo a depor as armas?
Quando Nhongo se entender com o Estado, virão a correr para apontar erro aqui, ali e acolá. A ciência antecipa-se, está na vanguarda e não a reboque.
Afonso Dhlakama, em vida, não ligou a nenhuma intervenção de cientistas, que o criticavam e o chamavam ditador, fez e desfazer, matou até a doença o debilitar e vezes sem conta havia desmentidos de que ele não estava doente -a quando as pessoas próximas dele, disso sabiam e iam revelando a pessoas mais chegadas - e mais tarde os que os censuram mudaram de discurso - que pecado os moçambicanos que estão menos preocupados com a Frelimo e com a Renamo cometeram para se pretender arrastar o DDR em nome da ciência ou academia?

terça-feira, 26 de maio de 2020

SILOSIKAGUME: QUEM TEM MEDO DE GUSTAVO MAVIE?

SILOSIKAGUME: QUEM TEM MEDO DE GUSTAVO MAVIE?: Quem tem medo de Gustavo Maviel?* Mavie é livre de falar como quiser. De escrever também. O texto do confrade Marcelo Mosse, na sua Ca...

QUEM TEM MEDO DE GUSTAVO MAVIE?


Quem tem medo de Gustavo Maviel?*

Mavie é livre de falar como quiser. De escrever também. O texto do confrade Marcelo Mosse, na sua Carta de Moçambique, parece ser o que ele nega a Gustavo Mavie. Não precisamos de concórdia: chama-se a tudo isso, pluralidade de ideias.
Se Marcelo Mosse opinar como Mavie, então não se saberá distinguir quem é Marcelo quem é Gustavo. Não se pode ter medo de academias. Esse medo de criticar, que se calhar não seria do que Mavie pratica em relação à Frelimo, levou a duas coisas:
I)O Ministério da Saúde proibiu, inicialmente, que usássemos máscaras, dizendo que só deveriam usa-las os médicos e pessoas doentes, e não nos deu alternativa, porque somente aceitava as recomendações da OMS, sem procurar uma saída para a prevenção da doença do coronavírus senão a lavagem das mãos, distanciamento social (mais tarde foram aceites máscaras de pano, que já estavam a ser usadas em Angola);
II) O MISAU deixou que fossem implantados túneis de desinfecção e tardiamente veio dizer que são inúteis e, mais do que isso, constituem um risco à saúde humana.
 Tudo isso, aceitámos porque temos medo do que se fala em nome da ciência. Pensa-se que os cientistas, incluindo os sociais, não falham, são o nosso Deus na terra, o que não é verdade.
Em Portugal, não passam muitos dias, foram tornados públicos falsos casos positivos para a Covid-19. O alarme já soava. Corrigiu-se. Quer dizer, os testes laboratoriais podem falhar, o mesmo que dizer que os cientistas falham. A diferença é que as suas falhas nem sempre são públicas.
 Se cada um fizer as críticas no que lhe parece, num determinado campo, seja político seja socioeconómico, e outros fazem-no em relação ao lúdico, cultura e outras coisas, Moçambique é que ficará a ganhar.
Deixem-no ser como ele é: Luck Dube disse que se não tem nada a dizer de bom acerca de alguém, o melhor é permanecer calado ( Shut Up).
Qual é o problema de Mavie criticar os que critica (?), qual é o problema de Marcelo Mosse criticar os que critica (?).
Cada um tem as suas formas de viver os problemas na sociedade moçambicana: há quem considere Afonso Dhlakama um herói, mas outros consideram-no Homem da Guerra. Podemos discutir isso sem amarras.
Há quem queira Gustavo Mavie calado, para passear a sua classe. A discussão é indispensável até para o crescimento intelectual.
Há quem considere as Universidades Moçambicanas um grande Dumba Nengue;  outros, que saem dessas universidades, aplaudem sem crítica essa maninha de sempre tabelar por baixo, esquecendo-se que a expansão do ensino até à sua consolidação revelará fraquezas e só a entrega dos professores e estudantes podem minorar esse problema.
Gostaria de repetir, para os que me acompanham há anos, e aos que por acaso vão ler este texto, o seguinte:
“Em 1965, foi inaugurada uma universidade em Lourenço Marques (…). No programa de ensino deste estabelecimento foram incluídas unicamente faculdades de ciências sendo as letras e as humanistas (SIC) totalmente desconhecidas.
No ano lectivo de 1966 ela foi frequentada por 403 alunos, sendo em seis o número de estudantes africanos, dois dos quais estrangeiros.
Um facto digno de notar é que os filhos dos portugueses muito abastados não são enviados para esta Universidade. Eles continuam a frequentar as universidades em Portugal e na África do Sul. A razão que os leva para lá são as seguintes.
1.O diploma da faculdade de Lourenço Marques não é reconhecida em Portugal.
2.No caso de concorrência a um quadro, o «formado» em Portugal tem sempre maior preferência. (o mesmo é o caso dos quadros formados nas universidades da África do Sul);
3.A falta de faculdades, de modo que o aluno possa escolher o curso em que estiver interessado.
4.O baixo nível do corpo docente”. 
Os excertos podem ser consultados no livro de eli j. e.mar, cujo título é “Exploração portuguesa em Moçambique, 1500-1973), na página 194.
Seria admirável que a Universidade Eduardo Mondlane fosse uma ou a mais robusta de Moçambique? Não. Logo: quando debates vários assuntos, temos que buscar premissas verdadeiras. Não basta que um académico reconhecido seja onde for, fora de Moçambique, diga umas coisas, para nós aceitarmos sem nenhuma reflexão.
Dei o exemplo do MISAU.
Creio que se começarmos a discutir determinadas coisas, vamos melhorar a nossa vida e até dendefer a nossa saúde.
Mais, voltando à vaca fria, os que combatem Gustavo Mavie usam as armas que eles acham que não são as melhores – atacam Mavie, mas eles dizem que Mavie é que tem o hábito de atacar a todos que criticam o regime.
Mavie acabou sendo mais importante do que me parecia, pelo facto de o seu nome ter chegado à Assembleia da República. Lembraria o Rogério Dinis, o MC Roger a cantar: «Falem bem ou mal de mim, mas falem de mim». Deve ser esse o sentimento de Mavie por estas alturas: virou tema de discussão!

 NB: Não postava nada, faz algum tempo. Claro que continuo a escrever na minha coluna "FONTE", que sai à quarta-feira no Diário de Moçambique. Senti que vale a pena alargar o debate, porque se pensarmos que Mavie não tolera os outros, do que tenho estado a ler, a intolerância  evidencia-se também entre os que o criticam, pelas palavras que usam e pelo sentimento de que, por emitir opiniões diferentes das deles, chegou a hora de pagar por ESSA OUSADIA, de pisar em terrenos "proibidos", na Assembleia da República. Nunca percebi que a crítica fosse vista como escrutinar porque a pessoa criticar pode-se defender ou o seu círculo está livre de o defender.



quinta-feira, 14 de novembro de 2019

DIABÓLICO NÃO PERCEBER CRISE NO SEIO DA RENAMO


Ataques armados no centro: da urgência
de editorais e mais pesquisa na imprensa?
 [Jacaré do Ossufo Momade: recomenda-se D. Jaime, em 2016, à Visão!]

“Diabólico é não percebermos os efeitos das crises no seio da Renamo, desde a era de Afonso Dhlakama”.

I
Manteigas Gabriel apela às FDS para matarem Mariano Nhongo?” Conheci-o como José Manteigas Gabriel, nome com que se apresentou numa conferência de imprensa na cidade de Quelimane, nos finais da década de 1990. Custa-me trata-lo doutra maneira. Mas estou a acostumar-me e, por isso, escrevi Manteigas Gabriel.
O importante é que a frase interrogativa entre parênteses, foi o ensaio do título para este artigo. Preferi o presente à primeira prova: pereceu-me, aquele, menos amistoso, de revolta, embora pudesse reflectir o meu estado de espírito, perante mortes de civis e de polícias, da forma mais brutal e absurda.
(…)
Achei interessante um artigo, de uma publicação que se reputa a prática de jornalismo assente na investigação: “Sem nenhum ‘atacante’ e muito menos provas factuais apresentadas publicamente, como tem sido hábito, a Polícia da República de Moçambique (PRM) voltou a responsabilizar os homens armados do maior partido da oposição, Renamo, de serem os autores dos ataques que se têm registado na zona centro do país, em particular no distrito de Gondola, província de Manica”.
Os excertos constam de um artigo publicado no dia 8 de Novembro corrente. Não cito o órgão, porque é de pouco interesse o fazer: está abaixo do que julgo importante discutir, tendo em conta o título e o ensaio.
A fim de facilitar a interpretação resumo: o autor da prosa e o próprio órgão que a publica, não aceitam que os ataques sejam da autoria dos homens da Renamo, contrariamente ao que a Polícia declara publicamente. Contestam o posicionamento das forças do Ministério do Interior. Por quê? O texto exige que a PRM apresente um atacante da Renamo e provas factuais publicamente.
O jornalismo recomenda isso, é verdade. Mas torna-se intrigante quando José Manteigas Gabriel, porta-voz da Renamo, nega que a violência armada esteja associada ao partido Renamo e a publicação não exige nenhuma prova, mesmo após a declaração da chefe da bancada, Ivone Soares, na Assembleia da República:
‘ [A Junta Militar da Renamo] É assunto de dentro de casa. É assunto da nossa família. São os nossos parentes, nossos guerrilheiros e a Renamo, como família, saberá resolver os problemas da sua própria família’.
Esta afirmação, pública, nada indicia? Estranho! A publicação não se preocupa com as declarações de Manteigas Gabriel e de Ossufo Momade, sobre a existência de tais homens, mas sim com provas factuais que devem ser apresentadas pela Polícia. A Polícia, no entanto, não quer saber se os atacantes estão ligados a Mariano Nhongo ou a Ossufo Momade. Privilegia aspectos virados para a segurança dos moçambicanos e a liberdade de se deslocarem para onde quiserem em Moçambique, tendo como referência que existe um partido armado no país.
Curioso e citando a mesma publicação, que se apresenta como cultora de informação rigorosa, na edição de 11 de Novembro, Ossufo Momade disse [sábado], em Quelimane: ‘Se o Estado moçambicano deixa que o jacaré cresça, já não é da responsabilidade de Ossufo Momabe’. Acrescentando: ‘O Estado moçambicano tem os seus serviços’ “ e a responsabilidade de esclarecer as questões de segurança”.
A PRM quer, sim, inversamente ao discurso, que a Renamo, como partido político, trate dos seus homens armados, fazendo jus à declaração, pública, da parlamentar Ivone Soares: ‘São os nossos parentes, nossos guerrilheiros e a Renamo, como família, saberá resolver os problemas da sua própria família’. Vejo a razoabilidade do posicionamento da Polícia nesse sentido, parecendo em vão a discussão sobre provas factuais.
Um dos factos: existe a Junta Militar da Renamo [não escrevo a autoproclamada Junta Militar da Renamo porque, só para lembrar, em 2013, quando reiniciaram os ataques a civis, Ossufo Momade falava de desmobilizados liderados por Hermínio Morais “General Bobo”; a imprensa, de homens armados da Renamo; e, por fim, ala Militar da Renamo – não será que a ala militar se autoproclamou e a comunicação social, de forma simpática, aceitou todas as designações escolhidas pela Renamo de Dhlakama?].
José Manteigas Gabriel declara e a imprensa aceita a sua justificação, de que os ataques não têm nada a ver com a Renamo, porque “os homens da Renamo estão acantonados na Gorongosa, à espera da reintegração”. Li, até, que há homens que entregaram armas no Dondo e em Nhamatanda: Gorongosa incorpora geograficamente Dondo e Nhamatanda? Falso.
Outros homens da Renamo disseram à imprensa que estavam estacionados em Muxúnguè, à espera do processo de DDR, tendo garantido que não fariam ataques armados. O deputado José Manteigas Gabriel está a dizer-nos que Muxúnguè não é Chibabava, mas sim Gorongosa?
Quem tem provas factuais das declarações de Manteigas Gabriel e de Ossufo Momade? Porque é que não se exigem provas factuais aos dois, considerando as declarações de Ivone Soares e as notícias sobre entrega de armas em Nhamatanda e no Dondo, e, ainda, as informações de Muxúnguè? Talvez falta de rigor.
Quem perguntou a Ossufo Momade, acerca do dono do jacaré que está a crescer? Ninguém. Qual é o órgão que exigiu provas da existência do jacaré, fora da Renamo? Não se conhece. Jacaré quer dizer Junta Militar da Renamo? Momade deixou claro isso, quando se queixou de o Estado não ter usado a lei contra Nhngo quando o ameaçou de morte.
Ele esquece-se que ao falar de novo conflito, se forem validados os resultados eleitorais, está a ameaçar os moçambicanos e se fosse questão de uso da lei, que a quer accionada contra Nhongo, também seria contra ele. Se Nhongo ameaçou de morte Ossufo Momade, uma pessoa, quando Momade fala de novo conflito armado, ameaça a todos os moçambicanos.

II
José Manteigas Gabrel faz uma declaração grave: ‘Se as Forças de Defesa e Segurança são incapazes de debelar este grupo [‘da autoproclamada Junta Militar da Renamo’], então não culpem a Renamo pelos ataques’. Ivone Soares, porém, disse na Assembleia da República que a Junta Militar é da Renamo. Se essa junta é o jacaré, então, tem dono, que o deve abater, e ponto final!
Ossufo Momade, sintonizado com Manteigas Gabriel, fala do “jacaré que o Estado” não deve deixar crescer e exime-se de culpas, mas Mariano Nhongo, quando apareceu publicamente, disse que a sua atitude era por não reconhecimento do actual presidente da Renamo, eleito em Gorongosa, no início deste ano.
Ossumo Momade e José Manteigas Gabriel querem que as forças do Estado matem Mariano Nhongo e o seu grupo. Não percebo outra coisa das declarações de ambos. A sociedade moçambicana lembra-se do que se dizia sobre Afonso Dhlakama perante actos de violência?
Vale recordar, por isso, que no reinício dos ataques armados, houve a tendência de que as FDS estavam mal treinadas. Di-lo Afonso Dhlakama e a imprensa aceitou, sem questionar essa versão. Quando as FDS atacavam [em contra-ataque] os homens da Renamo, a imprensa veiculava outros supostos sentimentos: a pretensão dos inimigos da paz e democracia era de assassinar Dhlakama. Falava-se da “solução angolana”. Dom Jaime Gonçalves chegou a acusar Filipe Nyusi de ter ido a Angola, para aprender como matar Dhlakama.

Citado pela “Visão”, Dom Jaime Gonçalves declarou: ‘Foi para mim uma humilhação terrível o Presidente de Moçambique [Filipe Nyusi] ter ido a Angola aprender como mataram Savimbi’. Quem exigiu provas factuais a Jaime Gonçalves, de que Nyusi tinha ido aprender como foi morto Savimbi para fazer o mesmo com Dhlakama?

O artigo foi escrito pela agência Lusa e a publicação “Visão” fez a sua divulgação na edição de 19 de Fevereiro de 2016. Assina o texto, Pedro Silva Bandeira, da agência Lusa, referindo:

Numa rara entrevista, D. Jaime Gonçalves, arcebispo emérito da Beira, defende que é tempo de a Igreja Católica se envolver outra vez no processo político moçambicano e travar um suposto plano para eliminar o líder da oposição, Afonso Dhlakama”.

Uma tentativa de interpretação das declarações de Dom Jaime Gonçalves, em relação ao finando Dhlakama, analisando, por equiparação, as declarações de Manteigas Gabriel, segundo as quais ‘ Se as Forças de Defesa e Segurança são incapazes de debelar este grupo [da autoproclamada Junta Militar da Renamo], então não culpem a Renamo pelos ataques’, e de Ossufo Momade, de Estado não deixar ‘que o jacaré cresça’, leva à seguinte conclusão:
Ossufo Momade, presidente da Renamo e o porta-voz do partido, José Manteigas Gabriel, querem que as forças do Estado matem o líder da Junta Militar da Renamo, Mariano Nhongo, e os seus apoiantes. A acontecer isso, depois mudariam de discurso e passariam a falar de pessoas que não querem a paz. Associado a isso, pode haver recrudescimento de mortes de civis.
A imprensa, podendo não ser no seu tudo, por falta de análise e devido a outros interesses, dos quais não se excluiu a forma como olha para o Governo e para o próprio partido Frelimo, aparentemente apoia as pobres [não gosto de adjectivos, mas em determinados momentos são inevitáveis] justificações de Ossufo Momade e de José Manteigas Gabriel sobre ataques armados no centro do país [áreas de Manica e Sofala, na N6 e N1].
Escrevi várias vezes, que Dom Jaime Gonçalves tinha ressentimentos com a Frelimo. Mas, acima de tudo, nem sempre manifestou a lucidez necessária, isso agravado pelas naturais dificuldades de pensar, de forma isenta, em tempo de conflito. De manhã – passe a expressão – podia declarar que a Renamo e Afonso Dhlakama não têm razão, mas ao cair da tarde mudava de discurso.
Vele o seguinte (primeiro exemplo): “Dom Jaime considera de ‘ilegítimas’ as reivindicações da Renamo em renegociar o AGP por se tratar de um grupo de cidadãos e não uma Nação. Diz não haver espaço para renegociação do AGP” (Savana, de 7 de Outubro de 2011, p.2). “Dom Jaime aconselha Renamo a ir à constituição da República” (p.1). Dhlakama se zangou: “Não preciso de religiosos para perceber o valor da Paz” (p.1).
Outro dado (segundo), em entrevista à “Visão”, em 2016. ‘Foi para mim uma humilhação terrível o nosso Presidente da República, o máximo magistrado da nação, ter ido a Angola aprender como mataram Savimbi [referência a uma controversa declaração do actual chefe de Estado, Filipe Nyusi, proferida em Novembro, em Luanda, quando apontou Angola como um exemplo de um país onde a oposição não anda armada]”.
A compreensão do último exemplo, passa por ler toda a entrevista concedida à “Visão”, que não a transcrevo. Não saberia dizer se declarar que Angola é exemplo de um país onde a oposição não anda armada é controverso ou não. Mas posso perguntar: é polémico dizer que em Portugal, São Tomé e Príncipe, Brasil, África do Sul, Namíbia, Zimbabwe [Zimbabwe é exemplo de crises], Guiné-Bissau [com eternas crises] e outros países os partidos não andam armados? Não percebo.
Por tudo isso, sinto-me impelido a repetir o que Anabela Gradim escreveu no manual de jornalismo:  “O jornal não só serve para relatar de forma isenta factos e acontecimentos, pode e deve pronunciar sobre esses factos, tentando extrair deles o seu real significado, as relações que estabelecem com outros acontecimentos, e as consequências que poderão vir a ter na vida das pessoas”.

Pano de fundo: há ou não relação ataques armados a civis no centro de Moçambique, com a crise no seio Renamo chefiada por Ossufo Momade e a existência de homens por desmobilizar, reintegrar e desarmar, incluindo os da Junta Militar liderada por Mariano Nhongo? As leituras que foço mostram que sim, há relação.

Estas questões são mais importantes do que aceitar ou negar as versões de Ossufo Momade/José Manteigas Gabriel, PRM ou Mariano Nhongo. Há que extrair o real significado da crise na Renamo e relacioná-la com outros acontecimentos, cujas consequências são evidentes: morte de civis e danificação de bens de privados, mortes de polícias e destruição de bens do Estado. Parece estar claro!

Pode ser que, novamente, a Igreja, tenha de se envolver no processo político moçambicano, mas, desta vez, para aproximar Ossufo Momade e Mariano Nhongo, salvo se concordar com a ideia do deputado da Renamo, de o Estado matar Nhongo.

Desde 2012, quando do caso da Rua dos Sem Medo, o que percebo é que a imprensa enfrenta imensas dificuldades na elaboração de editorais, sobretudo, e de outras opiniões, de modo frio, para orientar a sociedade.

Quando os leitores “esperam” que os jornais emitam “opiniões e orientações rigorosas e  fundamentais”, sobre o tipo de violência que se repete no centro de Moçambique, são desorientados, através de discursos difusos, de questionamentos parciais, como fiz questão de exemplificar. O que é isso de a imprensa aceitar, passivamente, que Ossufo Momade fale do “jacaré” que está a crescer. Qual é o habitat do jacaré? Quem é o dono do jacaré?

O presidente da Renamo deveria ser confrontado, no sentido de explicar quem é e onde está o jacaré, se não for da Renamo? Mas o que se lê são os eternos ataques à Polícia, mesmo quando esta não tem culpa no cartório. É lícito a imprensa responsabilizar as Forças de Defesa e Segurança por desavenças, públicas, da Renamo, de que resultam ataques a civis? O pior é que quando as forças do Estado agirem, a imprensa voltar-se-á contra elas.

Uma explicação parcial revela que há não poucos profissionais que não se lembram do que escreveram sobre vários assuntos e, em particular, acerca da violência envolvendo a Renamo. Até não sabem quais foram os resultados das eleições de 2009 para as comparar com as de 2019. Não estou a falar de erros, pois,Errare humanum est, perseverare autem diabolicum [Errar é humano, mas perseverar no erro é diabólico].

É diabólico não perceber que as crises no seio da Renamo asfixiam a paz – ainda que existam tantos e tantos problemas, quer gostemos quer não gostemos do Governo, da Frelimo e, por fim, de Moçambique. Não se pode andar a brincar às falsidades do José Manteigas Gabriel, do Ossumo Momade e seus jacarés, porque, dessa maneira, adiamos tudo e semeamos mortes e destruições. Não é aceitável nem razoável a “nossa” cegueira.


quinta-feira, 22 de agosto de 2019

MARIANO NHONGO


Mariano Nhongo está a fazer das suas. A deputada Ivone Soares declara: É assunto de dentro de casa, é assunto da nossa família.
Lembra aquela: Dhlakama sempre ameaça. Não há-de fazer nada. Pode viver onde quiser, em qualquer ponto de Moçambique.
Leio Raul Domingos a consifderar que a Renamo foi mais enganado.

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Chimwenje, Young Pioneers e Al Shabab



Chimwenje, Young Pioneers e Al Shabab
[Tudo problemas internos do partido Frelimo?]
I
Estarrecido. Dá para ficar. A facilidade com que selamos, como uma verdade, o que os políticos dizem, lembra-me o serial journalist (1998:65), descrito por Furio Colombo, escriba italiano autor da obra “Conhecer o Jornalismo Hoje: Como se Faz a Informação”, livro emprestado a um amigo ou colega que, indubitavelmente, não merece mais a minha confiança, quanto ao respeito por bem alheio, pois não mais mo devolveu. “Como nasce uma notícia” é o propósito da referência a Colombo.
Talvez mesmo, o caso de entrevista: “ […] um instrumento imperfeito e raramente credível, em que o risco de [o entrevistador ou jornalista] ser usado é tão grande quanto o risco de usar o entrevistado” (p.85). Esta observação de Colombo faz parte da abordagem “A entrevista”. Mas se dissesse que isso permite ler a entrevista concedida por Afonso Dhlakama ao Savana (20 de Outubro de 2017, p.1, 2 e 3), estaria próximo ou distante do enquadramento? Que o leitor tire as suas conclusões.
Por falar de italiano, lembro-me do Kamal. Veio, em Maio de 1994, ao Aeroporto Internacional de Roma para nos transportar num pequeno carro até ao Hotel Astrid, defronte do Largo Antoni Sarti. Estava com colega Fernando. Íamos ao “ Traning Course for Professionals Journalists from New Democracies”.
“Don’t sleep Francisco!...”, era o que dizia Kamal (Bahar Kamal, salvo erro), vendo-me a dormir no carro, quando, em situação normal, estaria a apreciar a cidade de Roma. Pela primeira e, até aqui, a única vez, pisava aquela capital que acolhe o Estado do Vaticano. Mas a sonolência me dominava, de sorte que por mais vontade que tivesse de manter os olhos abertos, não conseguiu. Por quê?
Esta coisa de a LAM alterar datas ou atrasar voos, não é de hoje. Passei por isso naquele ano e outros anteriores e seguintes. A minha viagem acabou por começar numa manhã, manhã de espera no Aeroporto da Beira até à tarde, quando finalmente aterrou um boeing da chamada “nossa companhia de bandeira”. Cheguei a Maputo quando o avião da Air France estava prestes a partir. Já se movimentava a escada e travei uma discussão azeda, porque há quem me quisesse atribuir responsabilidades, afirmado: “O senhor deveria ter chegado a Maputo ontem…”
Engano! A LAM era a culpada porque nesse “ontem” a companhia não fizera o voo marcado. Pior, ainda, é que no dia seguinte, fê-lo com bastante atraso, para passageiros que iriam fazer ligações para Joanesburgo, pois os de Lisboa estavam numa situação tranquila, porque a partida era a noite. Fui o último a embarcar na aeronave da Air France.
Cheguei a Paris cerca das 8:00 horas do dia seguinte e quando desembarquei em Roma, estava cansado e cheio de sono. O “don’t sleep Francisco”, repetido várias vezes, até Hotel Astrid, não era atendido. Outra recomendação de Kamal, depois de receber as liras para a minha subsistência: “Don’t spend all your money…
Se no primeiro caso tive que confessar, correcto ou não, “I’m so tired” [estou tão cansado], no segundo, só me pus a rir. Era já um trintão, embora aos olhos de Kamal pudesse parecer mais novo do que era na realidade. Não ia gastar todo o dinheiro, com certeza. Até economizei e esqueci de cambiar umas liras que, com o tempo, se perderam ou estão guardadas onde já não sei!
Kamal foi quem nos mostrou, primeiro, parte de Roma. O resto descobrimos. Ele explicou que usava um carro pequeno para conseguir circular naquela cidade com engarrafamento que não lembrava nenhuma urbe moçambicana em 1994. Creio que a cidade de Maputo até hoje não chega aos níveis de congestionamento “romano”.
Compilou-se um manual com as divisas do jornalismo: “Tell the Truth”. Esta é uma delas. Essa verdade de difícil decifração (?) deve ser procurada, por jornalistas, em princípio, como atitude profissional incontornável e como uma bússola.
Mandaria um abraço ao Kamal. Porém, ele, mesmo se estiver vivo 23 anos depois, não haveria de ter acesso a esta prosa como, outrossim, estou convencido que até colegas do curso, um angolano, um etíope, um malawiano, dois eritreus, dois ugandeses e dois tanzanianos, sobre Fernando me abstenho, talvez não. Por quê?
Durante o curso destinado a profissionais de jornalismo das novas democracias africanas, ficou evidente que a África é lida a partir da visão ocidental [as notícias fazem o curso um país de África-Ocidente- vários países africanos, a partir do Primeiro Mundo] e, por isso mesmo, as notícias do continente reportadas preferencialmente informam sobre guerras, fome, miséria, enfim, reportam males. Ninguém estaria interessado em um escrito como este, embora, se calhar, a referência ao Al Shabab possa despertar atenção. Até os malawianos devem não se recordar do seu grupo Young Pioneer!
Por esse lado entro, quando procuro ler a violência e o surgimento de grupos sobre os quais não se tem uma explicação clara em Moçambique, o bastante, dois dos quais mataram: Chimwenje e supostos membros do Al Shabab. O terceiro, Young Pioneers, mas o primeiro conhecido cronologicamente, entrou em Moçambique, existiu, supostamente ou não, saiu ou desapareceu sem provocar derramamento de sangue e, quiçá, nem prisão.
II
De repente, ocorreu o que os moçambicanos nunca tinham ouvido falar durante a Guerra dos 16 Anos. Um grupo, denominado Young Pioneers, do Malawi, estava no país. A notícia referia que entrou em Moçambique “depois de confrontos com as forças armadas do Malawi”, constituindo um batalhão “acomodado numa base da RENAMO no distrito de Milange, na Zambézia, alegação que foi desmentida pelo movimento liderado por Afonso Dhlakama” (Diário de Moçambique, de 12 de Janeiro de 1994, p.1).
O Malawi pedia o repatriamento desses “jovens pioneiros”, integrando mil homens ligados ao partido do Hastings Kamuzu Banda, que, no mesmo ano, através das eleições, foi sucedido por Bakili Muluzi.
Os Young Pioneers não parece terem disparado armas no território nacional, que provocasse instabilidade em Moçambique, até ao seu desaparecimento, não sei se documentado ou não. Acerca deles pouco se sabe. Mas vale a pena referir que o jornal The Monitor, daquele país, escreveu na sua edição de 11 de Abril de 1994: “ They will only retur on Tembo’s orders-Renamo: MYPs Ok In Mozambique” (Diário de Moçambique, de 26 de Abril de 1994, p.16).
O texto refere que eles “estão bem instalados e regressarão ao Malawi logo que sejam solicitados pelo senhor John Tembo (ministro malawiano do Estado)”, atribuindo-se esta declaração a um oficial da Renamo identificado como sendo Alberto Carlos, o qual explicou: “Nós tomamos cuidados deles porque nos assistiram nos momentos difíceis da nossa guerra”.
Carlos também, de acordo com a tradução do texto do trissemanário The Mirror, publicada no Diário de Moçambique, acrescentou: “Eles cederam-nos instrutores treinados por israelitas para formarem elementos da RENAMO. Inclusivamente tivemos oportunidade de treinar os nossos homens em Mount View Military, no Malawi”.
Esta é a primeira questão sobre a presença em Moçambique, em determinados momentos, de homens armados, estrangeiros [os armados moçambicanos, podem não ser conhecidos numericamente, são uma referência suis generis da democracia] sem uma explicação muito bem dada, não sendo de admirar os supostos integrantes do Al Shabab em Mocímboa da Praia ou qualquer outro lugar do território nacional. Lembrar que estrangeiros ilegais atravessam diariamente as fronteiras moçambicanas, seria salutar.
II
Uma vez ultrapassada a questão dos Young Pioneers de Hastings Kamuzu Banda, surge a grave problemática do grupo designado Chimwenje. Assinala-se que Joaquim Chissano e Afonso Dhlakama assinaram o Acordo Geral de Paz em Roma, Itália, sem nunca se ter falado desses homens armados zimbabweanos, que aterrorizaram parte da Estrada Nacional nº1 e regiões de Manica.
Para surpresa de parte dos moçambicanos, publica-se um artigo sob o título “Exigindo dinheiro e não só…:Rebeldes Zimbabweanos assassinam em Dombe”. «Três pessoas foram mortas quando, recentemente,  um grupo de rebeldes zimbabweanos “Chimuenjes” atacou uma unidade moageira, na sede do posto administrativo de Dombe, distrito de Sussundenga, na província de Manica.
Xavier Johane Moiane e Matias Mute são duas das três vítimas e as mortes tiveram lugar após os “Chimuenjes” terem exigido dinheiro e comida a trabalhadores de uma moagem na sede de Dombe» (Diário de Moçambique, de 4 de Abril de 1995, p.16).
Porque em anteriores ocasiões, quando contestava a retórica de que Moçambique passou 20 anos sem disparo de armas, sobre o grupo Chimwenje escrevi, farei um pequeno resumo, incluindo as suspeições de ligação rebeldes-Renamo, os pronunciamentos de Afonso Dhlakama acerca do assunto e as cautelas de Chissano em 1996.
Atribui-se a Dhlakama, num encontro com Chissano, em que debateram “últimos desenvolvimentos políticos”, a afirmação de que “se houver algum homem da Renamo envolvido nos incidentes, estará a fazê-lo a título pessoal e, por isso, deve ser tratado criminalmente” (Diário de Moçambique, de 17 de Novembro de 1995, p.1).
O mais grave é quando se escreve: “Terror instala-se na EN Nº1”. “Um morto, três feridos e muito dinheiro roubado, constituem o balanço preliminar do assalto à mão armada verificado cerca das 2.00 horas da manhã de ontem a dois autocarros da empresa Virgínia e a um camião, no espaço entre Muxúnguè e Rio Búzi, distrito de Chibabava, na província de Sofala” (Diário de Moçambique, de 10 de Janeiro de 1996, p.1).
O lado interessante é que os assaltantes afirmavam: “Vocês que andaram a votar em Chissano e na Frelimo vão pagar caro pela vossa escolha. Porque é que não votaram na Renamo e em Afonso Dhlakama?
Este assunto chegou à Assembleia da República e pode ter sido discutido entre Moçambique e Zimbabwe (Diário de Moçambique, de 19 de Janeiro de 1996, p.1).
Curioso é que, mudando do entendimento inicial, Dhlakama considerou depois que se trata de manobras da Frelimo, “através de grupo de moçambicanos preparados na cidade da Beira e com retaguarda segura no distrito de Nhamatanda” (Diário de Moçambique, de 20 de Janeiro de 1996, p.1).
O grupo Chimwenje foi introduzido em Moçambique em 1983 e treinado pela Renamo, reagindo à presença de militares zimbabweanos no país (Diário de Moçambique, de 28 de Fevereiro de 1996, 1e 16). Esta “revelação” é feita por Cristopha Makwame, tido como um oficial Chimwenje capturado pela Polícia (p.16).
Chissano vai à Assembleia da República e explica:
O legado da guerra recente aconselhou-nos calma, ponderação e bom senso no tratamento deste tipo de assuntos.
Neste sentido, em vez de entrarmos em acções de repressão generalizada e provocar convulsões desnecessárias, decidimos enveredar por uma acção selectiva, minuciosamente estudada e direccionada a objectivos bem identificados e delineados com vista a não deixarmos escapar os elementos nocivos, incluindo os ditos chimwenjes ao mesmo tempo que evitamos que pessoas inocentes sejam sacrificadas. Continuaremos a proceder desta maneira até onde a prudência aconselhar e os interesses nacionais os ditarem” (Diário de Moçambique, de 1 de Março de 1996, p.1)
Talvez o mais relevante, seja o excerto:
Com a condenação, anteontem, de sete elementos do grupo em que somente um, Luck Mulombo, é zimbabweano, a penas de dois a 16 anos de prisão maior por mercenarismo e rebelião armada, chegou ao fim o longo julgamento do caso chimwenjes, que vinha decorrendo há cerca de quatro meses no Tribunal Judicial Provincial de Manica (TJPM), na cidade de Chimoio” (Diário de Moçambique, de 7 de Setembro de 1996, p.1)
III
Posto tudo isso, de forma resumida, mesmo não se tendo falado do caso Vega 5, não parece razoável que fiquemos admirados com supostos integrantes do Al Shabab. Também ninguém se deve deslumbrar com as declarações atribuídas a Afonso Dhlakama, tais como os atiradores de Mocímboa da Praia são todos jovens locais, que conhecem com precisão a geografia do local”.
Se gostasse de especular, poderia concordar parcialmente com o entendimento de Dhlakama, de que os ataques a Mocímboa têm “cunho político” e “não há estrangeiros a manipular as metralhadoras e catanas”, mas, inversamente, lançando um olhar sobre quem sairia beneficiado com essa desordem, tendo em conta o mesmo momento político sobre o qual assenta a conclusão do presidente da Renamo.
Dhlakama estranha que os ataques tenham iniciado depois da evolução das negociações entre o governo e a Renamo, e o Presidente Filipe Nyusi ter saído com autoridade reforçada no congresso da Frelimo terminado a 2 de Outubro. “A minha inteligência em Mocímboa da Praia falou-me que (os ataques) são problemas internos da Frelimo”, disse Afonso Dhlakama, em contacto telefónico, a partir da Gorongosa. É isso que se reporta.
Para ele é pouco provável que os atacantes sejam radicais, tal como tem sido noticiado. Para mim, o que é pouco provável é a Frelimo ter um problema interno de que resultem ataques do género. Mas, suporto a minha objecção no que tem marcado o processo político moçambicano e, no caso, dei os exemplos de Young Pioneers e grupo Chimwenje. Se quisesse, poderia arrolar mais elementos. Reputo de conclusão forçada, senão mesmo preguiçosa, a de que quem atacou e aterrorizou Mocimboa da Praia visava embaraçar Filipe Nyusi (Savana, de 20 de Outubro de 2012, p.1).
As questões de defesa e segurança em Moçambique têm falhado de tal sorte que o próprio Afonso Dhlakama tira proveito disso. Somente num país assim é que conseguiu se rearmar em 2012, provavelmente com um plano bem estudado desde que se fixara em Nampula em 2009. Já entraram estrangeiros do Malawi, estes até de forma recorrente perturbam Niassa, e zimbabweanos, com armas. Outros não, por quê? Não invento nada.
O historiador Michel Cahen escreveu que os quadros da Renamo, em 1994, durante a campanha eleitoral, garantiram a Afonso Dhlakama que tudo estava bem e que só não ganharia as eleições se houvesse fraude, escondendo a verdade no terreno.
Dhlakama agora afirma: “ […] com base naquilo que a minha inteligência me informa como líder, isso é um problema interno da Frelimo. São alguns chefes no seio da Frelimo que não estão a gostar das negociações entre Dhlakama e Nyusi, porque estas negociações podem pôr termo ao conflito […]” (Savana, de 20 de Outubro de 2017, p.1).
Parece, insisto, que a conclusão é forçada. Mas o que é de substância é que o diálogo permita o fim do conflito em causa e doutros conflitos que se registam mesmo depois da assinatura do Acordo Geral de Paz. De Filipe Nyusi e Afonso Dhlakama espera-se que viabilizem isso, mas a versão da inteligência da Renamo sobre Al Shabab deixa muitas dúvidas.